Por Eliane Cantanhêde
Mais do que se agarrar a um fiapo de esperança com as sinalizações do ministro Luiz Fux no Supremo, o ex-presidente Jair Bolsonaro joga suas fichas na anistia, que finge ser para os vândalos de 8/1, mas foi feita para ele no Congresso. O Supremo está atento e já posicionou seus canhões contra o projeto, ampliou novamente o foro privilegiado para quem é acusado de crimes cometidos em mandatos anteriores e já usa na prática a mudança ao puxar de volta um processo contra Gilberto Kassab, "dono" do PSD, que estava na primeira instância.
O inquérito, por suposta propina de R$ 16 milhões da JBS, foi enviado por Alexandre de Moraes para a primeira instância em 2019 e acaba de ser trazido pelo mesmo Moraes para o STF. Em sequência, entre fevereiro e março, Kassab se reuniu com Bolsonaro, a anistia ganhou tração no PSD e no próprio Congresso, o STF mudou o entendimento sobre foro e o caso contra Kassab voltou ao STF. Kassab alega que o caso está arquivado e já transitou em julgado, mas será que vai liberar o PSD a favor de Bolsonaro e contra o STF? Difícil... Está aberta uma guerra entre Judiciário e Legislativo. E o Executivo tem lado.
Pelo Placar da Anistia do Estadão, 190 dos 513 deputados eram a favor da anistia até esta quinta-feira, 27, mas muitos se dizem favoráveis só para os estúpidos do 8/1, não para Bolsonaro e os cabeças do golpe, e vai caindo a ficha de que seria um ataque ao STF, que revidaria e Kassab é só uma advertência. Jogue a primeira pedra quem não tem nenhum probleminha na Justiça, com emendas, desvios e processos eleitorais. Os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre, e da Câmara, Hugo Motta? Quantos deputados e senadores?
Na frente jurídica, Bolsonaro está de olho em Fux, que tenta marcar uma posição garantista e fugir do "efeito manada", em que todos votam da mesma forma. Mas gostaria de ser o novo Marco Aurélio Mello, sempre "do contra", na direção oposta dos colegas? Apesar de pedir vistas no caso da cabeleireira Débora Santos, a do "Perdeu, Mané", e de defender que o julgamento do "núcleo crucial" do golpe fosse no plenário, Fux manteve a unanimidade da primeira turma para acatar a denúncia da PGR e tornar réus Bolsonaro e líderes militares.
Assim, Fux se tornou uma incógnita e está no centro das questões mais nevrálgicas do julgamento: foro privilegiado, primeira turma ou plenário, delação de Mauro Cid, tentativa e golpe efetivo, dosimetria de penas. Mas o radar principal dos réus não está na justiça, mas sim na política, menos nos ministros do STF e mais nos deputados e senadores. E eles estão mais preocupados em salvar a própria pele do que a de Bolsonaro. O Supremo sabe disso, como sabe ser bem "convincente".
O Estado de S.Paulo
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