Windor Roberto Magalhães dos Santos se orgulhava de sentença contrária ao cantor Roberto Carlos
Vera Magalhães
Ele passou boa parte da vida tendo de soletrar o próprio nome, que parecia inglês, mas era uma invenção da sua avó, lá de Ribeirão Preto. Apesar disso, Windor Roberto, filho de Windor Antonio, gostava do nome, e não escondia a frustração por não ter conseguido passá-lo adiante, pois teve duas filhas -e uma delas, que lhe deu dois netos, não acatou a singela ideia de dar continuidade à dinastia.
O nome diferentão não foi a única coisa que o filho único, nascido nas Laranjeiras, no Rio de Janeiro da mãe Alduína, herdou do pai paulista. Também vieram dele a paixão pelos dois tricolores, Fluminense e São Paulo, e pelo tênis, esporte no qual pai e filho duelavam e se estranhavam nas quadras do Club Athletico Paulistano ou da chácara da família na zona sul da capital.
Mais tarde, depois de uma breve hesitação, também foi convencido a buscar a mesma carreira do patriarca, a magistratura. Foi amor à primeira sentença. Aos 37 anos, o então advogado, formado na turma do pesado ano de 1964 da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), finalmente encontrou o ofício no qual se realizou.
A insistência para que prestasse vários concursos até ser aprovado, em 1979, foi da mulher (ela tinha horror a ser chamada de esposa), Vera Maria. O casamento, em 1970, foi a união do filho de juiz e a filha de promotor de Justiça, e as tertúlias jurídicas foram uma das tônicas de uma relação intensa, marcada por algumas tentativas malsucedidas de separação, e que perdurou até a morte dela, em 2018.
A carreira de juiz ditou as mudanças da família pelo interior paulista: primeiro para Andradina, no noroeste do estado, e depois para Santo André, no ABC, onde viveram por 13 anos. Ali, Windor ingressou no Rotary, presidiu júris memoráveis, sofreu ameaças de alguns réus que condenou e acumulou troféus no tênis pelo Clube Atlético Aramaçan.
Foi promovido a juiz do 1º Tribunal de Alçada Civil em 1995, e se tornou desembargador do Tribunal de Justiça em 2005. Aposentou-se em 2011, às vésperas da chamada "expulsória", que ainda acontecia aos 70 anos. Seu pendor pela magistratura era tal que não encontrou energia para voltar a advogar ou se dedicar a outra atividade profissional.
Os colegas de toga se lembram do rigor jurídico e da tenacidade com que defendia seus pontos de vista nos julgamentos. "Enquanto judiquei na área cível, aprendi com ele e guardei seus ensinamentos na busca por uma Justiça mais humanizada. Foi um exemplo de retidão e justiça", lembrou o também desembargador aposentado Newton de Oliveira Neves.
Entre as decisões de que mais se orgulhava estava a sentença contrária à tentativa do cantor Roberto Carlos de impedir a publicação de uma série de reportagens pelo jornal "Notícias Populares", em que fez um libelo a favor da liberdade de imprensa.
A leitura diária dos jornais, aliás, figurava entre seus maiores prazeres até o fim, juntamente com a música, o cinema e os muitos esportes que praticou. Morreu no último dia 7, em São Paulo, aos 83 anos. Deixa as filhas Vera Regina e Roberta e os netos Lucas, Felipe, Heloísa e Pedro.
Folha de S.Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2025/04/mortes-nome-diferentao-e-amor-aos-esportes-marcaram-vida-de-juiz.shtml