17 de abril de 2025
'Jogo político': 'O bolsonarismo vai precisar de Tarcísio candidato a presidente' |
'Jogo político': 'O bolsonarismo vai precisar de Tarcísio candidato a presidente'

'Jogo político': 'O bolsonarismo vai precisar de Tarcísio candidato a presidente'

Newsletter semanal do jornalista Thiago Prado continua a série de entrevistas com estrategistas políticos ouvindo Paulo Vasconcelos, debate os desdobramentos da chegada de Gleisi Hoffmann à Esplanada dos Ministérios e recomenda podcast do 'Porta dos fundos'

Por Thiago Prado

Bom dia, boa tarde, boa noite, a depender da hora em que você abriu esse e-mail. Sou o editor de Política e Brasil do GLOBO, e nessa newsletter você encontra análises, bastidores e conteúdos relevantes do noticiário político.

O carnaval que misturou Sapucaí com o Oscar acabou, então é hora de voltarmos à série da newsletter entrevistando os principais estrategistas políticos e donos de institutos de pesquisa do Brasil.

Nesta quarta-feira de cinzas, com o país ainda de ressaca, é a vez de ouvir o marqueteiro Paulo Vasconcelos, responsável pelas campanhas vitoriosas de Fuad Noman, em Belo Horizonte (2024), e Cláudio Castro, no Rio de Janeiro (2022). Vasconcelos também foi o pensador da estratégia política do hoje deputado federal Aécio Neves em tempos mais gloriosos para o PSDB.

O marqueteiro, o quinto ouvido pela "Jogo Político" desde janeiro, falou sobre Lula, a direita e as disputas estaduais de 2026 em Rio, São Paulo e Minas Gerais.

Leia abaixo os principais trechos da conversa.


Na semana passada, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, deu uma opinião "em on" que começa a aparecer nas conversas "em off" com petistas: contra a corrente, ele disse que o marqueteiro Sidônio Palmeira está errando ao expor ainda mais a figura do presidente Lula em entrevistas e discursos. O que acha da análise: o presidente tem que falar mais ou menos em tempos de perda de popularidade?

Respeito o senador, mas discordo. Botar o Lula para falar será sempre uma força. Agora, é preciso lidar com os novos tempos, e o presidente e o PT perceber que envelheceram. Primeiro, vai ser preciso reaprender a falar em eventos. Não existe mais o discurso em sindicato fechado. Menos espontaneidade e menos improviso talvez sejam importantes.

Mas isso não tira um dos principais ativos de carisma do presidente?

De vez em quando, é bem-vindo algo fora do roteiro, sim. Mas o principal é: ainda percebo muita mágoa e coisas ditas com o fígado pelo presidente. Noto uma narrativa às vezes um pouco irritada, nada doce. Esse não foi o Lula que venceu a eleição em 2002. O que ganhou naquele ano foi o cara que botou grávidas na TV, tocando o coração das pessoas. Grande parte da derrota do (Jair) Bolsonaro foi pela boca. Imagine uma hipótese: se pudéssemos ter trancado Bolsonaro num quarto na pandemia sem poder falar, teria sido fácil vender na campanha um governo que comprou milhões de doses da vacina. Como ele fez questão de tirar sarro da dor das pessoas, perdeu a eleição.

Insistir na comparação com Bolsonaro é outra estratégia da era Sidônio. Não acha que falar demais do adversário acaba deixando ele mais vivo do que nunca na mente dos brasileiros como uma opção?

Não acho. Sidônio deve estar naquele momento ainda entendendo no que o governo é bom e no que o governo é ruim. Quando souber as respostas, acho correto o movimento de comparar os tempos. Agora, para fazer isso não precisa soprar a brasa e citar o nome do Bolsonaro, não. Mas é importante, sim, falar dos dados e relacionar com as administrações passadas. É dizer que "nos últimos anos", e tal... Jamais mencionando o cara.

Não há um certo discurso cômodo na esquerda de dizer que a direita vence o debate virtual porque trabalha com fake news?

Acho que nunca houve no Brasil uma narrativa de oposição tão bem estruturada desde o primeiro dia de governo como agora. É o caso do Pix, é o ovo caro, tudo isso bem contado para a população gera um desgaste muito grande. É preciso plano de comunicação para isso, sei que parece o mesmo papo de sempre, mas não é. O governo tem que ter cabeças pensantes, trabalhar com formulação, ser servido por boas agências. No pronunciamento recente que o Lula fez enaltecendo as suas marcas, o governo se comunicou da mesma forma em várias plataformas. As coisas fizeram sentido naquele dia de maneira uniforme. É isso que precisa acontecer mais vezes.

Mas Lula ficar requentando anúncios de programas na TV por enquanto não tem rendido frutos. Concorda com a tese de Felipe Nunes, da Quaest, de que há uma espécie de "fim da gratidão" do eleitor?

Funciona mais ou menos assim: Santos Dumont não venceria uma eleição hoje porque inventou o avião. Ou seja, os programas sociais não pertencem mais ao Lula. Pertencem ao país. Os últimos governos de Dilma Rousseff a Jair Bolsonaro prometeram manter ou ampliar o Bolsa Família, por exemplo. Há um empoderamento das pessoas, que se afastaram da dependência do estado. Vai ser preciso criar uma nova narrativa para alcançar o quarto mandato, ter novos produtos.

No Brasil, acabamos de atravessar uma eleição de altíssima taxa de reeleição municipal, os governadores estão bem avaliados, mas o presidente da República, não. Por que essa diferença entre aqueles que estão sentados nas cadeiras do Executivo?

Prefeitos e governadores têm entregas mais próximas da população, como ruas, estradas e pontes. Já as questões nacionais acabaram impactando mais a vida das pessoas, como a inflação.

Chama a atenção como até a segurança pública, que sempre foi atribuída aos governadores, também virou fator de desgaste para o Planalto...

Pegou como uma marca do antipetismo. Há uma imagem do PT passando a mão na cabeça de bandido, a favor dos direitos humanos. Antigamente, esse assunto só era tratado pelos mais sofisticados. Agora, não. Os segmentos C, D e E são os que mais tratam do tema. Acaba que a classe média consegue arrumar um jeito de se defender.

Há uma tese defendida por alguns de que a primeira-dama Janja atrapalha a imagem do governo. Concorda ou discorda?

Vejo muito mais como um incômodo do establishment. Não gostam de vê-la dando pitaco. E acho também que é mais inveja, um cara mais velho com uma mulher mais nova.

Aqui na série de entrevistas da newsletter já houve quem dissesse que é o fim da linha para a popularidade de Lula e quem cravasse que ele vencerá em 2026. Você está de que lado?

Não é o fim da linha. Acho que Lula buscou um profissional que eu respeito, o Sidônio, e que está usando todos os medicamentos possíveis. Está claro, no entanto, que a doença não foi curada, e entendo o quão desesperador isso parece ser. Mas pode ser que daqui a seis meses estejamos falando em cima de outro cenário, com um presidente menos nas cordas como agora.

E se não melhorar, Lula pode desistir?

Claro, estamos falando da alma humana. Ele chegará aos 80 anos, quer seguir respeitado e querido por onde passa. Por outro lado, não enxergo ninguém competitivo para o lugar. Fernando Haddad já virou fatura liquidada.

O governador Tarcísio de Freitas será o adversário no campo da direita?

Essa é aquela hora que você quer que tenhamos bola de cristal, né? Vamos lá. Acho que Tarcísio tem surpreendido a muita gente fazendo o dever de casa. Ele se mantém leal a Bolsonaro, mas tendo nome e sobrenome. Isso é muito necessário para quem tem a temperatura dos novos tempos. Não existirão mais bonecos. Seja no Dnit, como ministro e agora como governador, ele terá entregas para mostrar. Claro que Bolsonaro pode insistir numa candidatura, colocar o filho Eduardo, nesse capítulo bola de cristal, tudo pode. Mas, respondendo à sua pergunta: está claro para mim que o bolsonarismo vai precisar do Tarcísio. Ele precisará ser candidato.

Uma condenação e até mesmo prisão de Bolsonaro pelo Supremo Tribunal Federal às vésperas da campanha vai acuá-lo ou vitimizá-lo ainda mais diante da população?

Acho que há um problema maior que atrapalha hoje em dia a legitimidade de decisões da Justiça: a perda de respeito do Judiciário perante a sociedade nos últimos anos. Ao mesmo tempo que tivemos catástrofes políticas como o Mensalão, o Petrolão e o 8 de Janeiro, também lemos muitas manchetes de jornais com os supersalários entre os juízes; ou todo um noticiário envolvendo a lentidão judicial e até mesmo os casos em que bandidos são soltos.

E os outros candidatos da direita? Leva fé em Ronaldo Caiado, Romeu Zema, Pablo Marçal e Gusttavo Lima?

Acho que Caiado e Zema não deveriam ficar tão encantados. Podem pontuar agora, mas, na hora da onça beber água, pode não ser tão animador. Zema, principalmente: em 2018, o marqueteiro dele foi a Lava Jato. Em 2022, não teve adversário, o Alexandre Kalil simplesmente não se preparou para a campanha. Ele vai ter que explicar a dívida de Minas, o dobro de quando ele assumiu. Marçal ficou inelegível, dificilmente poderá concorrer. E Gusttavo Lima... Bem, não consigo imaginar aqueles dentes brancos e aquela barba preta na TV falando de saúde pública. Vai passar aperto se for a debate.

Vamos falar dos estados. Começando pelo Rio, onde você ajudou a eleger o último governador. Cláudio Castro está em maus lençóis para eleger um sucessor e Eduardo Paes é o favorito?

Acho que a turma aliada do governador está apostando em uma equação que não vai funcionar bem assim. É mais ou menos isso: "A grande fraqueza de Eduardo Paes será estar associado à esquerda no interior, e o Rio é o estado mais evangélico do Brasil". Só que a última campanha do Paes no Rio foi um divisor de águas, na minha opinião. Ele conseguiu se posicionar como alguém de centro. Não estou dizendo que não vai ter tensão para ele no interior, claro que vai. Mas o projeto dele vem com consistência faz tempo, atacar o Cláudio na campanha para prefeito já foi bastante estratégico. Paes hoje não tem oposição no estado, e quem quiser fazer isso, tem que começar agora. (Alexandre) Ramagem só começou a ser opositor quando a TV começou, em agosto (Paulo também coordenou a campanha do deputado do PL). É preciso pesquisar dados e criticar o governo Paes de maneira consistente.

O presidente da Assembleia Legislativa, Rodrigo Bacellar, é uma boa escolha do grupo de Castro para sucedê-lo?

Primeiro, Cláudio precisa ser melhor avaliado e, para isso, precisa dar uma arrumada na sua comunicação. Ele fez uma única campanha de balanços do governo até agora, e mesmo assim dentro da disputa eleitoral para prefeito. Essa ausência de conversa com o eleitorado provoca desgaste. Sobre os nomes: Bacellar tem trajetória de político no Legislativo, porém vai ter que trabalhar no campo das promessas. Tendo a achar que quem tem entregas a mostrar e conexão com a história que será contada tenha mais chance de performar. Nesse sentido, o (ex-prefeito de Duque de Caxias), Washington Reis poderia aparecer mais (o emedebista hoje está inelegível devido a uma condenação colegiada por crime ambiental).

Castro deveria renunciar em abril do ano que vem para se candidatar a algo ou concluir o seu mandato?

Deveria ser candidato. Qualquer governador do Brasil não deveria deixar de ter a proteção de um cargo eletivo.

Em Minas Gerais, Zema vai eleger o sucessor ou a direita rachada vai dificultar a vida do governador?

Acho que a candidatura do senador Cleitinho vai ajudar o Matheus Simões (vice-governador de Zema e pré-candidato ao governo). Ele é uma espécie de Celso Russomano mineiro, não vai ter uma argumentação estruturada. Matheus vai poder se posicionar ao centro e falar das realizações do governo. Ele é muito técnico e preparado.

Rodrigo Pacheco, Alexandre Silveira ou Alexandre Kalil podem ser bons adversários?

Não vejo Pacheco querendo, está escondido viajando por EUA e Europa. Silveira está vivendo demais o governo e Brasília, está muito distante do dia a dia de Minas. Já Kalil vai precisar repactuar sua relação com a política, e não estou vendo nada disso acontecer.

Falando de São Paulo, está claro que você considera que Tarcísio virá a presidente. Sendo assim, como fica a sucessão?

A regra em São Paulo é a centro-direita ganhar. Não consigo enxergar um cara de Ribeirão Preto votando na esquerda. Não vão entrar no rodeio, vão ser expulsos da cidade.

Ricardo Nunes está se movimentando para ser o nome...

Não acho que tenha musculatura para deixar a prefeitura e dar um voo mais alto. Acho que o sucessor pode ser um outsider abençoado por Tarcísio. Olho também para o ex-governador Rodrigo Garcia. Mas, de novo: tem que ser abençoado. O sucessor será alguém apontado por Tarcísio.

Um Kassab bolsonarista não pode vingar?

Kassab é inteligente. O bastidor é melhor que a vitrine.

E o campo lulista pode vir de Geraldo Alckmin?

Cheguei a testar o Alckmin em 2022 para governador e o resultado já não era bom. Também não acho o Márcio França competitivo. Sinceramente, acho que quem o Tarcísio colocar a mão, leva.


Gleisi no ministério e o significado do que vem por aí

Muitos textos foram publicados na imprensa desde o anúncio feito pelo presidente Lula de que a deputada federal e presidente do PT, Gleisi Hoffmann, assumiria a articulação política do governo no lugar de Alexandre Padilha, novo ministro da Saúde.

No GLOBO, Vera Magalhães escreveu no sábado sobre as duas correntes de leitura desta escolha: "Há aqueles que acham que o presidente errou e vai enfraquecer Fernando Haddad, da qual fazem parte inclusive integrantes do próprio PT, e a dos que veem a chegada de Gleisi à SRI como uma forma de 'amarrá-la'. Segundo um proeminente ator para a governabilidade, uma vez ministra a hoje dirigente do PT não vai poder 'ficar detonando o ministro da Fazenda nas redes sociais', e terá de atuar em favor da aprovação de sua agenda." Já Adriana Fernandes, na Folha de S. Paulo, mostrou seu cetismo quanto ao surgimento de uma Gleisi menos crítica a Haddad: "É balela o argumento propagado por palacianos de que, na cozinha do Planalto, Gleisi irá moderar as críticas. Só não vai propagá-las em público".

Miriam Leitão, no GLOBO, e Maria Cristina Fernandes, no Valor, destacaram o caráter pouco amplo de abrir espaço para mais um petista na Esplanada. "A ida de Alexandre Padilha para a Saúde e de Gleisi Hoffman para as Relações Institucionais torna o governo mais petistas e cada vez mais distante da frente de que ele precisa", analisou Miriam. "Sua volta ao Palácio do Planalto, nove anos depois do impeachment de Dilma, preocupa porque a queda acentuada na popularidade do presidente pressupõe que seja a hora de construir uma base mais ampla que permita ao Lula se recuperar para a disputa sucessória de 2026. E Gleisi, na condução do PT, tem marcado posições que dificultam a unidade até mesmo dentro da sua legenda", publicou Maria Cristina.

Merval Pereira e Carlos Andreazza, no Estado de S. Paulo, projetaram um futuro de ainda mais turbulências para o governo com a chegada de Gleisi ao Planalto. "Me parece mais provável que a manobra seja no sentido de enfraquecer Haddad para retirá-lo de cena, substituindo-o por um ministro mais adepto do desenvolvimentismo, como por exemplo Aloizio Mercadante, que dirige o BNDES", escreveu Merval. "Lula radicalizará no improviso e na gastança. Nas expansões fiscais e parafiscais. É impressionante a quantidade de bilhões que propõe por fora do orçamento. Pé-de-Meia. Auxílio Gás. Plano Safra. Lista a aumentar. Pendure-se. Empurre-se a bomba para 2027", afirmou Andreazza.

O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2025/03/05/jogo-politico-o-bolsonarismo-vai-precisar-de-tarcisio-candidato-a-presidente-diz-marqueteiro-de-claudio-castro.ghtml