25 de abril de 2025
O presidente do PSB Carlos Siqueira - Foto: Brenno Carvalho / Agência O GLOBO |
Entrevista: Lula deveria fortalecer quem estará com ele em 2026 e não será o Centrão, diz presidente do PSB

Entrevista: Lula deveria fortalecer quem estará com ele em 2026 e não será o Centrão, diz presidente do PSB

Carlos Siqueira entende que petista poderia estimular parlamentares a migrarem para siglas aliadas e afirma que presidente cometerá 'erro gravíssimo' se não repetir chapa com Alckmin no ano que vem


Por Renata Agostini - Brasília

Presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira diz que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deveria ter feito uma mexida mais ampla no governo no início deste ano e critica o esforço do petista para agradar partidos do Centrão. Em entrevista ao GLOBO, o dirigente avalia que o presidente deveria estar preocupado "o núcleo que o garante", composto por PSB, PDT e PCdoB. A sigla de Siqueira tem a vice-presidência da República e dois ministérios na gestão do petista.

- Não sei porque Lula insiste em dar tanto cargo ao Centrão. Ele não pode ter ilusão. O Centrão é de qualquer governo e vai ficar esperando o sopro do vento. Se Tarcísio (de Freitas, governador de São Paulo) se apresentar como candidato, eles o apoiarão - afirmou ele.

Siqueira deixará em junho o comando do PSB, que presidiu por mais de uma década, e fará seu sucessor, com a eleição do prefeito de Recife, João Campos. Ele entender não haver espaço para o PSB estar longe de Lula em 2026 e diz que há tempo para o petista recuperar a popularidade, mas avalia ser preciso "mais iniciativa" para "criar nova perspectiva para o país".

Temos pouco mais de um ano para a eleição. O senhor acredita que Lula conseguirá recuperar a popularidade até lá?
Tem tempo, mas é preciso mais iniciativa. É preciso criar nova perspectiva para o país. O governo até agora não tratou de maneira adequada, por exemplo, o tema da segurança, que é uma questão central e que afeta diretamente grande parte da população brasileira.

A PEC da Segurança Pública pode ser um caminho?
Não se resolve segurança com PEC. Você resolve segurança com ação e com uma visão que passa pela repressão rigorosa ao crime organizado, o que pode ser feito pelo governo federal. Por onde entram as armas? Quem é que não sabe, no Brasil, quem são as cabeças do crime organizado?

Lula optou por mudanças pontuais em seu ministério. Como o senhor vê essas mexidas?
Poderia ter feito mais. Não propriamente com o PSB, porque não reivindicamos cargo. Mas o problema do governo é político e não administrativo. Há uma mudança no perfil do eleitorado brasileiro, que decorre de fatores que são quase insuperáveis, relacionados a valores e ao protestantismo neopentecostal. Se comparar com o de Jair Bolsonaro, estamos melhores. Só que o país continua dividido. Você tem que oferecer um programa que una mais setores.

Os debates sobre a reforma ministerial incluíram mudanças nos ministérios do PSB. Houve desconforto no partido?
Não deixa de ser. Principalmente quando se falava do Alckmin. Achava desastroso se o movessem de lugar. Também não acreditava que Lula tivesse coragem de fazer. Não justificaria colocar o (Rodrigo) Pacheco (ex-presidente do Senado), que nem sequer assume que pode ser candidato (ao governo de Minas Gerais). Isso nos incomodou. Seria um erro político grave, mas felizmente não vai acontecer.


A reforma ministerial seria para aproximar os partidos, mas eles parecem não querer se comprometer com 2026 agora.
O deputado do União Brasil recusou o ministério. O Lula não pode ter ilusão. O Centrão é de qualquer governo. Ele vai ficar enquanto for conveniente, vai ficar esperando o sopro do vento. Se Tarcísio (de Freitas) se apresentar como candidato (à Presidência), eles apoiarão a candidatura dele. Não tenha dúvida disso. Os partidos que tiveram com Lula no primeiro turno da eleição presidencial é que deveriam estar sendo fortalecidos. É o núcleo que garante ele.

De que forma?
O governo tem muita margem de manobra para, por exemplo, incentivar parlamentares a mudarem de partido. Também na reforma ministerial. É preciso acabar com a ilusão de que esse Centrão vai estar com ele. Só se Lula estiver muito bem. Não são partidos programáticos. Agora, se Lula quisesse fortalecer PSB, PDT, PCDB, poderia ter agido diferente. Lula queria o compromisso desses partidos em 2026 e nenhum assumiu. Não sei porque Lula insiste em dar tanto cargo ao Centrão. Basta as emendas que já são excessivas.

Há a necessidade de aprovar projetos no Congresso até lá.
A única coisa importante mesmo para votar agora é a questão do imposto de renda (isenção para quem ganha até R$ 5 mil). Duvido muito que Centrão tenha coragem de votar contra. Quer evidência maior do comportamento do Centrão do que o PL da Anistia? É mais do que uma derrota para o governo. É uma derrota da democracia. As pessoas foram lá querer tomar de assalto o poder, quebrando tudo.

O senhor vê algum cenário no qual o PSB não caminhe com o Lula em 2026?
Não consigo ver. Infelizmente, a polarização vai continuar. Em momentos de insensatez política, o meio-termo não funciona. O ideal seria ter possibilidades diferentes, mas não teremos, infelizmente.

Há risco para a manutenção da chapa Lula e Alckmin?
Seria um erro gravíssimo. Alckmin é uma figura respeitadíssima da política nacional e que ajudou imensamente no arco de alianças. Compreendemos isso e demos as boas-vindas a ele exatamente por esse papel que ele pôde exercer. Um partido, em certas horas, tem que colocar os interesses nacionais à frente dos seus interesses. Alckmin tem dado provas cabais de lealdade, de trabalho. Um vice melhor do que o Alckmin ele não vai conseguir.

Uma ala do PT entende que Alckmin será necessário na eleição em São Paulo.
É uma visão completamente equivocada, porque São Paulo está perdido em matéria de sucessão. A esquerda não ganhará eleição lá. Pode até disputar, ter bom percentual, mas não ganha eleição.

De qualquer forma, Lula precisará de palanque em São Paulo.
Levar ao sacrifício a pessoa que pode ajudar o governo? Além do mais, pergunte ao Alckmin se ele quer ser candidato a governador de São Paulo. Acho que não. Ele é um homem de bom senso. Alckmin perdeu boa parte do eleitorado dele, que era o eleitor anti-PT. Vão votar nele agora? O país mudou politicamente. A esquerda precisa assumir seus valores e defendê-los. E ter seus aliados em torno de um programa que unifique o país, defenda valores democráticos e progressistas.

Houve um recado importante para a esquerda na eleição municipal?
Terrível. O PT diz que o Centrão avançou porque tem muitas emendas. Mas o PT tem a segunda maior bancada, 69 deputados com emendas. Nenhum recebeu menos de R$ 50 milhões. Tem ainda sete senadores, três governadores, o presidente da República, os principais ministérios. Com tudo isso, fez menos prefeitura que o PSB. O PT foi em condições favoráveis. É preciso fazer leituras fincadas na realidade. Foi um sinal político, que deve nos fazer refletir e mudar em relação ao futuro.

O presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, era filiado ao PSB e foi afastado do cargo diante da descoberta de uma esquema fraudulento no órgão. O episódio constrange o PSB?
De fato, ele foi filiado ao partido até janeiro deste ano, mas se desligou, e sua indicação não foi do PSB, que sequer foi consultado.

O PSB convidou Marina Silva para se filiar?
Ela não me procurou. Entendo que, dentro do grupo dela, há uma defesa desse caminho (depois que seus aliados perderam a eleição no comando da Rede). Nós não temos objeção, mas não sei se ela vai ficar convencida disso. Temos um novo programa, aprovado por unanimidade no último congresso do partido. Somos um partido que quer desenvolver o país preservando o meio ambiente, mas sem tantas limitações que vejo sendo pregadas por ela.

João Campos deve assumir o comando do PSB. O que se espera com essa troca de guarda?
É um nome que eu promovi com essa visão de renovação. Não é apenas o fato de ser jovem. Ele está fazendo os embates que o pai dele (o ex-governador Eduardo Campos) fez, mas muito mais cedo e sendo vitorioso. O fato de ter enfrentado embates políticos tão jovem já demonstra sua capacidade e potencial de se tornar uma liderança não apenas no Estado, mas nacional.

O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2025/04/24/lula-deveria-fortalecer-quem-estara-com-ele-em-2026-e-nao-sera-o-centrao-diz-presidente-do-psb.ghtml