Governadores alardeiam tese do fim da reeleição como caminho para quebrar a polarização entre lulismo e bolsonarismo
Por Vera Magalhães
Não só boa parte do poder e do dinheiro brasileiros se mudou para Nova York nesta semana, como já vive em 2026. Os prognósticos correntes nas conversas nos muitos eventos simultâneos na cidade não são nada animadores para Lula e o governo.
O presidente brasileiro escolheu exatamente as mesmas datas da Brazilian Week, efeméride anual que reúne políticos e empresários nos Estados Unidos, para visitar Rússia e China. Estabeleceu-se, assim, uma espécie de polarização também nas agendas internacionais.
Em Nova York, o governo federal está com contingente modesto, representado pelo ministro dos Transportes, Renan Filho, e pelo secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan. A maioria dos ministros acompanha Lula. Um dos resultados é a presença em bem maior número de governadores, muitos assumidamente pré-candidatos a presidente no ano que vem (e já a pleno vapor).
Nas rodas de conversas, esses governadores - saudados por anfitriões e pela classe empresarial em diferentes ocasiões como a "melhor safra" de gestores estaduais da História recente - se queixam do clima de ceticismo que dizem ter encontrado da parte de potenciais investidores em relação ao Brasil. E, claro, debitam essa falta de confiança na conta do governo federal.
Queixas quanto à dificuldade do Executivo de "fazer o dever de casa" na austeridade fiscal apareceram até em discursos de aliados como o presidente da Câmara, Hugo Motta, em sua fala nesta terça-feira no evento do grupo empresarial Lide. Foi uma forma de dividir as responsabilidades por alguns impasses institucionais que têm atrasado a agenda econômica e dividido os Três Poderes.
As conversas ao pé de ouvido sobre a sucessão presidencial também encontraram terreno fértil nos encontros nova-iorquinos. Em muitas delas, a possibilidade de Lula não disputar a reeleição é considerada grande. Os aspirantes a seu lugar aproveitam o clima para vender o próprio peixe e articular alianças -principalmente com partidos que vão formando conglomerados gigantes e estão aboletados na Esplanada dos Ministérios, diga-se.
A tese do fim da reeleição ganhou tração nestes últimos dois dias, impulsionada pela ideia de que tirar essa possibilidade de cena seria uma condição fundamental para quebrar a polarização entre lulismo e bolsonarismo. Isso porque a maior alternância de candidatos abriria possibilidades para toda uma geração de jovens governadores de oposição que, dessa maneira, não precisariam se acotovelar agora pela unção de Jair Bolsonaro em 2026, porque poderiam ver perspectivas de chegar sua vez nos pleitos seguintes.
Não à toa, quem vocalizou a defesa do fim da reeleição e se dispõe a ser candidato a um "mandato de transição" da atual polarização é o veterano entre os gestores estaduais, Ronaldo Caiado, de Goiás. Ele tratou de conversar sobre o assunto com vários potenciais rivais que estão em Nova York, como Tarcísio de Freitas (SP) e Eduardo Leite (RS).
A prosa dominante nesse ensaio geral para 2026 desenrolado nos Estados Unidos é que os cada vez maiores partidos do Centrão deveriam se unir para apresentar uma agenda mínima ao país, a partir da qual se definiriam um ou mais candidatos a presidente. Um dos que costuram essa nova versão da Ponte para o Futuro com que o MDB começou a debandada do governo Dilma Rousseff antes do impeachment é justamente um dos cérebros daquela estratégia e ex-líder de vários governos: Romero Jucá.
Por tudo isso, chama a atenção a forma como o governo Lula aparece nas análises públicas e nas conversas privadas: como um mandato com olhos postos no passado, sem gás para apresentar novas perspectivas de futuro no tempo que lhe resta e com pouca capacidade de articulação política para frear esse movimento de debandada de aliados nada fiéis que acontece em plena luz do dia.
O Globo
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